Ambiência https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br O que está em jogo na nossa relação com o planeta Fri, 03 Dec 2021 21:06:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Novo endereço https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/12/03/novo-endereco/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/12/03/novo-endereco/#respond Fri, 03 Dec 2021 21:06:07 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=1035 Este blog continua na Folha, mas, agora, em um novo endereço.

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Ex-ministros cobram Pacheco sobre projetos antiambientais no Senado

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PL no Senado pode induzir 53 mil km² de desmate com apenas uma obra, diz estudo https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/11/23/pl-no-senado-pode-induzir-53-mil-km%c2%b2-de-desmate-com-apenas-uma-obra-diz-estudo/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/11/23/pl-no-senado-pode-induzir-53-mil-km%c2%b2-de-desmate-com-apenas-uma-obra-diz-estudo/#respond Tue, 23 Nov 2021 10:57:46 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/09/Folhapress-320x215.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=1030 Obras planejadas pelo governo federal podem disparar o desmatamento nos próximos anos, caso as condições para o licenciamento ambiental sejam flexibilizadas, como propõe o PL nº 2.159/2021, que tramita no Senado e pode ser votado nesta semana.

O apontamento foi feito em duas notas técnicas produzidas pelo ISA (Instituto Socioambiental) em parceria com a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Através de modelos matemáticos, elas calculam uma explosão do desmatamento ligado a empreendimentos como a Ferrogrão e a BR-319, exemplos de obras que já são planejadas e devem ser dispensadas de responsabilidade pelo desmatamento caso o projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental seja aprovado pelo Senado.

A principal preocupação apontada no estudo é a vedação expressa feita pelo projeto de lei a condicionantes para a emissão da licença (como medidas de prevenção, mitigação e compensação de impactos ambientais).

O artigo 13 do projeto de lei, aprovado pela Câmara dos Deputados em maio, veda o estabelecimento de condicionantes ambientais sobre impactos causados por terceiros e sobre os quais o poder público detenha o poder de polícia.

“Como o combate ao desmatamento e demais atividades ilegais na Amazônia consistem em competência – e dever constitucional – inserida no âmbito do poder de polícia estatal, além de ser atividade realizada por ‘terceiros’, decorre que não mais poderão ser objeto de condicionantes ambientais quaisquer medidas para conter o desmatamento decorrente da instalação de empreendimentos de impacto, como estradas, ferrovias, hidrelétricas e outros”, afirma a nota técnica.

O projeto da Ferrogrão, ferrovia que deve ligar municípios produtores de soja a partir de Sinop (MT) até a região portuária de Mirituba (PA), pode gerar “desmatamento de 53.113,5 km² em floresta nativa no interior da bacia sua logística entre os anos de 2019 a 2030”, calcula o estudo.

O motor do desmate seria conversão de áreas de florestas e savana para o uso agrícola, já que 57% da vegetação nativa verificada na bacia logística do projeto ferroviário está em áreas com alta aptidão para o cultivo de soja.

Outra obra analisada pelo estudo é a pavimentação da BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO) e pode elevar o desmatamento anual no estado do Amazonas ao patamar de 9,4 mil km² em 2050. Entre 2015 e 2020, o desmate médio anual no estado foi de 1.150 km².

No caso da BR-319, a própria rodovia daria passagem ao desmatamento, facilitando o acesso a áreas preservadas. Cerca de 95% do desmatamento e 85% das queimadas na Amazônia se concentram em uma distância de até 5 km de estradas, diz a nota, a partir de dados publicados em 2014 nas publicações científicas Biological Conservation e International Journal of Wildland Fire.

“Com o asfaltamento e sem medidas controle do desmatamento, as emissões acumuladas de carbono também mais que quadruplicariam em relação ao cenário previsto sem a pavimentação, alcançando 8 bilhões de toneladas – equivalente à emissão de 22 anos de desmatamento na Amazônia Legal com base na taxa de 2019”, diz a nota.

“Ao tornar o licenciamento ambiental exceção e inviabilizar a adoção de condicionantes ambientais para prevenir a supressão ilegal de vegetação, o projeto de lei resultará no aumento do desmatamento da Amazônia Legal em níveis que impedirão o Brasil de cumprir suas metas assumidas no Acordo de Paris”, conclui.

O projeto que tramita no Senado prevê treze dispensas de licenciamento, além da criação de uma licença automática, sem avaliação prévia por parte do órgão ambiental, para a maioria das atividades impactantes para o meio ambiente, classificadas como de “significativo impacto ambiental”.

Apenas a minoria dos empreendimentos, classificados como de “significativo potencial degradador”, passariam pelo licenciamento com avaliação prévia de órgão ambiental.

De acordo com esse critério, 85,6% dos projetos de atividades minerárias e suas barragens em Minas Gerais passariam a obter licença automática, calcula a segunda nota técnica emitida pelo ISA e a UFMG.

“[O projeto de lei] ampliará sobremaneira os riscos de proliferação de novos desastres socioambientais, como as tragédias ocorridas em Mariana (MG) e Brumadinho (MG)”, conclui o estudo.

Relatora do projeto, a senadora Kátia Abreu (PP-TO) confirmou que a matéria pode ir à votação no plenário do Senado nesta semana, mas disse que ainda vai tentar finalizar o texto.

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Com salto de 22%, desmatamento anual na Amazônia atinge patamar de 13.235 km2 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/11/18/com-salto-de-22-desmatamento-anual-na-amazonia-atinge-patamar-de-13-235-km2/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/11/18/com-salto-de-22-desmatamento-anual-na-amazonia-atinge-patamar-de-13-235-km2/#respond Thu, 18 Nov 2021 21:40:31 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2020/05/Ibama.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=1019 O desmatamento por corte raso na Amazônia Legal foi de 13.235 km2 entre agosto de 2020 e julho de 2021, segundo a estimativa publicada nesta quinta-feira (18) pelo Prodes, projeto de monitoramento por satélite do desmatamento na Amazônia Legal, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

O crescimento em relação ao período anterior foi de 21,97%, quando o desmate na região havia atingido 10.851 km2. Neste ano, o estado do Pará liderou o ranking de áreas desmatadas no período, com 5.257 km2, seguido por Amazonas (2.347 km2), Mato Grosso (2.263 km2) e Rondônia (1.681 km2).

Diferentemente do que ocorreu em anos anteriores, o governo federal não criou uma agenda para o anúncio dos dados, que foram publicados no site do Inpe, sem ação de divulgação.

Na última quarta (17), uma nota do SindCT, o sindicato dos servidores públicos federais do setor aeroespacial, denunciou a imposição de sigilo da direção do Inpe sobre o resultado da estimativa anual do Prodes. Segundo a nota, a equipe técnica do Inpe havia submetido o relatório ao governo em meados de outubro, mas o sigilo impedia que a tramitação do processo fosse acompanhada pelos servidores.

A assinatura do documento divulgado pelo governo nesta quinta (18) informa a data de 27 de outubro. No último dia 10, em discurso na COP26, a conferência de mudanças climáticas da ONU, o ministro Joaquim Leite (Meio Ambiente), escolheu citar dados do boletim mensal do Deter/Inpe dos meses de julho a setembro.

“O governo mentiu na COP. Usou dados que apresentavam uma leve queda para anunciar que o governo estava no controle e escondeu os dados do Prodes, que desde 2005 são apresentados antes ou durante as COPs”, afirmou João Paulo Capobianco, ex-secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e vice-presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade.

“Este é o Brasil real que o governo Bolsonaro tenta esconder com discursos fantasiosos e ações de greenwashing no exterior”, afirma Mauricio Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil. “O que a realidade mostra é que o governo Bolsonaro acelerou a rota de destruição da Amazônia”.

O comportamento das taxas de desmatamento atuais é similar a períodos anteriores a políticas públicas de controle do desmatamento, como o PPCDAm (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, criado em 2004), que conduziram o cenário do desmatamento mínimo histórico de 4.600 km2 em 2012.

De lá para cá, o desmatamento na região passou a oscilar entre 6.200 km2 e 7.900 km2 até que, de 2018 para 2019, sofreu uma alta de 29%, subindo para um novo patamar de cerca de 10 mil km2. Em 2020, subiu para 10.900 km2 e agora, com o novo salto de quase 22%, vai à casa dos 13.235 km2, similar ao cenário de 2006, quando a área desmatada na Amazônia chegou a 14.300 km2.

Em valores percentuais, no entanto, o crescimento galopante do desmatamento não era observado desde os anos 90 – quando, de 1997 para 1998, subiu 24%.

“Este é o Brasil real que o governo Bolsonaro tenta esconder com discursos fantasiosos e ações de greenwashing no exterior”, afirma Mauricio Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil, através de nota. “O desmatamento na Amazônia já vem impactando o regime de chuvas em todo o Centro-Oeste e Sudeste do Brasil, causando graves prejuízos à segurança hídrica e alimentar do país”, diz o posicionamento da ONG.

“O resultado é fruto de um esforço persistente, planejado e contínuo de destruição das políticas de proteção ambiental no regime de Jair Bolsonaro. É o triunfo de um projeto cruel que leva a maior floresta tropical do mundo a desaparecer diante dos nossos olhos e torna o Brasil de Bolsonaro uma ameaça climática global”, disse Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, através de nota.

“É a terceira alta consecutiva no governo Bolsonaro e também a primeira vez desde o início das medições, em 1988, que a devastação sobe por quatro anos seguidos”, afirma.

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Brasil é o 4º país que mais mata defensores ambientais no mundo https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/09/12/brasil-e-o-4o-pais-que-mais-mata-defensores-ambientais-no-mundo/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/09/12/brasil-e-o-4o-pais-que-mais-mata-defensores-ambientais-no-mundo/#respond Mon, 13 Sep 2021 00:03:40 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/Imagem-de-Ari-na-Terra-Indígena-Uru-Eu-Wau-Wau-que-tem-um-longo-histórico-de-invasão-grilagem-desmatamento-e-ameaças.-Crédito-da-foto_-Gabriel-Uchida_Kanindé-320x215.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=1006 Com 20 assassinatos de ativistas ao longo de 2020, o Brasil ficou em 4º lugar no ranking dos países que mais matam defensores do meio ambiente e do direito à terra. Mais de 70% dos casos do país aconteceu na Amazônia e metade deles teve como alvo povos tradicionais indígenas e ribeirinhos.

No mundo, um terço dos 227 ataques foi contra indígenas – embora eles representem apenas 5% da população global.

No topo do ranking divulgado neste domingo (12) pela ONG Global Witness, estão Colômbia (65 mortes), México (30 mortes) e Filipinas (29 mortes).

O relatório com os dados de 2020 aponta que o setor madeireiro é o mais ligado a assassinatos, com 23 casos, em países como Brasil, Nicarágua, Peru e Filipinas. No México, nove dos trinta ataques estão ligados à extração de madeira.

Com 165 assassinatos no último ano, a América Latina concentra a maior parte (73%) das mortes ligadas a conflitos por território em todo o mundo. A região conta com o Acordo de Escazú, que entrou em vigor em abril com a ratificação de 11 países.

O acordo regional busca garantir a participação pública e o acesso à informação ligados a decisões na área ambiental, como licenciamento de obras de alto impacto. No topo da lista dos países que mais matam defensores ambientais, a Colômbia e o Brasil ainda não ratificaram o acordo.

O relatório também traça uma relação entre o número de ataques e o grau de liberdade cívica em cada país, a partir do monitoramento feito pela iniciativa Civicus, que classifica o Brasil e outros 46 países como espaços em que a liberdade cívica é obstruída.

Segundo o relatório da Global Witness, quase 50 dos 227 assassinatos globais aconteceram em regiões com liberdade cívica obstruída e mais de 150 deles ocorreram onde há repressão – classificação dada a 45 países, a partir da avaliação sobre censura, liberdade de organizar protestos, ataques a jornalistas, entre outros.

Já os 23 países classificados como regimes fechados contam com uma ressalva no relatório: o baixo número de casos pode ser atribuído à subnotificação.

No Brasil, a violência em conflitos por terra no último ano resultou na morte de Celino Fernandes, Wanderson de Jesus Rodrigues Fernandes, Virgínio Tupa Rero Jevy Benites e
Antônio Correia dos Santos.

Os ribeirinhos e indígenas de Nova Olinda do Norte, no interior do Amazonas, foram assassinados em agosto do ano passado em um crime suspeito de abuso policial, investigado pela Polícia Federal. São eles: Josimar Moraes Lopes, Josivan Moraes Lopes, Anderson Barbosa Monteiro, Mateus Cristiano Araújo e Vanderlânia de Souza Araújo.

As mortes de Zezico Rodrigues Guajajara, Ari Uru-Eu-Wau-Wau, Kwaxipuru Kaapor foram registradas em conflitos ligados à extração de madeira. Já a morte do pequeno produtor rural Carlos Augusto Gomes é registrada como um confronto com o setor do agronegócio.

Enfrentamentos ligados à reforma agrária contabilizam quatro dos vinte ataques letais no país: Fernando Ferreira da Rocha, Raimundo Paulino da Silva Filho, Raimundo Nonato Batista Costa e Claudomir Bezerra de Freitas.

As mortes dos indígenas Marcos Yanomami e Original Yanomami, assim como do guarda-parque Damião Cristino de Carvalho Junior, estão ligadas a conflitos envolvendo a atividade de mineração.

Os dados são reunidos anualmente desde 2012. Em 2017, o Brasil chegou a registrar 57 assassinatos e foi o país que mais matou defensores ambientais naquele ano. O número baixou para 20 mortes no país em 2018, mas voltou a subir em 2019, quando houve 24 registros de ataques letais e o país ficou em 3º lugar no ranking mundial. Os dados brasileiros são documentados pela Comissão Pastoral da Terra.

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Mundo ainda pode limitar crise do clima com ações imediatas, mostra IPCC https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/08/09/mundo-ainda-pode-limitar-crise-do-clima-com-acoes-imediatas-mostra-ipcc/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/08/09/mundo-ainda-pode-limitar-crise-do-clima-com-acoes-imediatas-mostra-ipcc/#respond Mon, 09 Aug 2021 08:19:30 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2021/08/globo-320x215.png https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=980 Novos cenários do futuro do clima revelam caminhos mais estreitos para conter o aquecimento global. O mundo deve começar a derrubar as emissões de gases-estufa a partir de agora para garantir o cenário mais seguro, com aquecimento global limitado a 1,5ºC – meta que evitaria as consequências mais desastrosas das mudanças climáticas e vem sendo usada como baliza para os anúncios de compromissos de líderes globais.

O orçamento atual – ou o quanto ainda se pode emitir – é de 300 gigatoneladas de gás carbônico (principal causador do aquecimento global).

Caso consiga se manter dentro desse limite nas próximas décadas, o mundo terá 83% de chances de conter o aquecimento global entre 1,5ºC e 1,9ºC. O acumulado histórico de emissões de carbono é de 2390 gigatoneladas, de 1850 a 2019. Só em 2020, o mundo emitiu outras 34 gigatoneladas.

As projeções são do novo relatório do IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU) divulgado nesta segunda (9). Ele traz uma revisão da base da ciência física do clima e foi aprovado na última sexta pelos 195 países que compõem o painel científico da ONU. 

O relatório traçou cinco cenários para a trajetória de emissões de gases-estufa e o consequente aumento da temperatura global.

Orçamento de carbono define avanço da temperatura global

IPCC traça cinco cenários de emissões de carbono e seus impactos na temperatura do planeta. (Imagem: IPCC)

Nos dois primeiros cenários, as emissões começam a cair imediatamente e garantem trajetórias próximas na limitação do aquecimento, que chegariam ao final do século em torno de 1,4 ºC no cenário de redução mais drástica de emissões e próximo de 1,8 ºC no segundo cenário de queda imediata, mas mais lenta, das emissões.

No cenário intermediário, as emissões atingem o pico por volta de 2040 e levaria um aquecimento próximo de 3ºC até o fim do século.

Nos últimos dois cenários, as emissões seguem subindo nas próximas décadas e levam a um aumento da temperatura média global de 3,7ºC e 4,4ºC até o fim do século.

O relatório também detalha de forma inédita o papel de outros gases-estufa no aumento da temperatura. Depois do protagonista carbono – que sozinho responde pelo acréscimo de quase 1ºC na temperatura do planeta entre 2010 e 2019, comparado ao período anterior a 1900 – o segundo gás que mais afeta o clima planetário é o metano. No mesmo período, o gás respondeu pelo aquecimento global de 0,5 ºC. 

“A vantagem do metano é que ele tem uma meia-vida curta, então qualquer redução de emissão tem um impacto em curto prazo no sistema climático global”, diz o físico Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo e membro do IPCC.

Segundo Artaxo, enquanto o gás carbônico tem meia-vida de milhares de anos (tempo necessário para que metade do número de átomos comece a se desintegrar), a do metano é de apenas onze anos. Ou seja, os efeitos da redução das emissões de metano podem ser percebidos no clima em um prazo mais curto.

O metano é emitido pelo setor agropecuário, principalmente por conta da fermentação entérica dos bovinos, e também pelo uso de fertilizantes nitrogenados, segundo dados da Embrapa. Como maior exportador de carne bovina do mundo, Brasil é um dos países mais desafiados no corte de emissões de metano.

Outra fonte de emissão do metano está em vazamentos que ocorrem na exploração de gás natural. “Essas emissões estão aumentando mais rapidamente, porque as termelétricas a carvão e a óleo estão sendo substituídas por gás natural, que tem eficiência energética maior. Com isso, há mais vazamentos e mais concentração atmosférica de metano”, diz Artaxo.

O estudo também quantificou a contribuição de poluentes como material particulado, monóxido de carbono e orgânicos voláteis para o aumento da temperatura global, assim como o efeito contrário: substâncias aerossóis contribuíram no sentido de esfriamento da atmosfera global – no caso do dióxido de enxofre, o impacto de esfriamento foi de 0,5ºC. No balanço, os gases que causam o efeito estufa mostram quantidades e efeitos mais amplos. A temperatura global atual  já é 1,1 ºC superior em relação ao período anterior a 1900.

A conta também mostra a contribuição humana para esse saldo: 1,07ºC do aquecimento se deve a gases emitidos por atividades humanas. O reforço de dados levou a uma linguagem ainda mais firme para definir a responsabilidade humana pela crise climática. Nos relatórios anteriores, essa relação era descrita como “muito provável”, clasifficação que indica probabilidade de 90 a 95%. No texto divulgado nesta segunda (9), a atribuição da mudança do clima às atividades humanas é dada como “virtualmente certa”, com probabilidade de 99% a 100%.

“Não é mais um debate sobre se as ações humanas dão causa à crise climática, mas do quanto. E o quanto, estimado pela primeira vez é estarrecedor”, diz Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima. “Além do mais, apesar de dizer que a chance de 1,5°C ainda existe, o documento também mostra que a janela para isso é estreita, e não comporta governos negacionistas”, conclui.

“Nossa oportunidade de evitar impactos ainda mais catastróficos tem uma data de validade. O relatório sugere que esta década é nossa última chance de adotar as medidas necessárias para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C. Se falharmos coletivamente em reduzir de forma rápida as emissões de gases de efeito estufa até o fim da década, essa meta ficará fora de alcance”, diz a vice presidente de Clima e Economia da ONG World Resources Institute (WRI), Helen Mountford.

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Em carta, 56 ONGs cobram que MPF retome força-tarefa na Amazônia https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/07/21/em-carta-56-ongs-cobram-que-mpf-retome-forca-tarefa-na-amazonia/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/07/21/em-carta-56-ongs-cobram-que-mpf-retome-forca-tarefa-na-amazonia/#respond Wed, 21 Jul 2021 15:37:52 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2020/05/WhatsApp-Image-2020-05-18-at-16.38.47-3.jpeg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=974 “Um sinal de recuo da atuação do MPF no enfrentamento aos crimes e à degradação ambiental”. É assim que a carta de 56 organizações ambientalistas e de direitos humanos descreve o encerramento da Força-Tarefa do Ministério Público Federal na região amazônica.

O texto foi enviado na terça (20) ao procurador-geral da República, Augusto Aras, ao Conselho Superior do Ministério Público Federal e às Câmaras de Coordenação de Meio Ambiente e de Populações Índigenas e Tradicionais.

Encerrada em fevereiro pelo MPF, a Força-Tarefa Amazônia promovia desde agosto de 2018 a coordenação entre seis procuradores dos estados da Amazônia Legal para operações contra crimes ambientais na região e também para reparação de danos, ações de tutela coletiva e controle de políticas públicas.

Sem implicar em custos adicionais, a coordenação havia sido criada para atuar por 18 meses e foi prorrogada por mais um ano, até o início de 2021. No período, a Força-Tarefa realizou 19 operações contra crimes ambientais.

“Como exemplo do seu impacto, as operações Karipuna e Floresta Virtual, realizadas em parceria com Polícia Federal e com o apoio de lideranças indígenas e organizações da sociedade civil resultaram na queda de 40% do desmatamento na terra indígena Karipuna em 2020”, diz a carta, que sugere a retomada da Força-Tarefa ou sua substituição por uma estrutura permanente de coordenação do MPF voltada para a região amazônica.

“Os crimes ambientais na Amazônia não ocorrem de forma isolada. Muitas vezes estão associados a corrupção, lavagem de dinheiro, fraudes, evasão fiscal, formação de milícias e assassinatos. Combater os crimes ambientais é também promover a segurança pública, a integridade das instituições e o próprio Estado de Direito. O MPF tem um papel fundamental nisso”, afirma Renato Morgado,gerente de meio ambiente e clima da Transparência Internacional Brasil, uma das signatárias da carta, junto a organizações como WWF-Brasil, Human Rights Watch, Conectas Direitos Humanos e Instituto Igarapé.

Confira a lista das organizações signatárias da carta:

1. 350.org Brasil
2. Amigos da Terra – Amazônia Brasileira
3. Associação Brasileira de Agricultores Orgânicos
4. Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida – Apremavi
5. Associação Interamericana para a Defesa do Ambiente – AIDA
6. BVRio
7. Center for Climate Crime Analysis – CCCA
8. Centro de Defesa e Educação Ambiental – CEDEA
9. Centro de Trabalho Indigenista – CTI
10. Coalicion Latinoamericana contra el Fracking por el Clima Água y Vida COESUS
11. Coalizão Não FRACKING Brasil pelo Clima Água e Vida – COESUS
12. Conectas Direitos Humanos
13. CSF-Brasil
14. Ecoa – Ecologia e Ação
15. Força Ação e Defesa Ambiental – FADA
16. Fundação Avina
17. Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável – FBDS
18. GT Infraestrutura19. Hivos – Instituto Humanista para Cooperação e Desenvolvimento
20. Human Rights Watch
21. Instituto 5 Elementos
22. Instituto Amazônia Livre
23. Instituto Brasileiro para a Transição Justa
24. Instituto Carbono Zero
25. Instituto Centro de Vida – ICV
26. Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia – IDESAM
27. Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC
28. Instituto de Pesquisa e Formação Indigena – Iepé
29. Instituto de Pesquisas Ecológicas – IPÊ
30. Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia – IMAZON
31. Instituto Ecológica
32. Instituto Escolhas
33. Instituto Igarapé
34. Instituto Internacional ARAYARA
35. Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB
36. Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN
37. Instituto Socioambiental – ISA
38. International Rivers – Brasil
39. Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais
40. Movimento de Ação Ecológica – MAE
41. Observatório do Carvão Mineral – OCM
42. Observatório do Clima
43. Observatório do Código Florestal
44. Observatório do Petróleo e Gás – OPG
45. Projeto Saúde e Alegria
46. Rede de Cooperação Amazônica – RCA
47. Rede Fé, Paz e Clima
48. Rede GTA
49. Rede Mar Sem Petróleo
50. Rede Pantanal
51. Rede Zero Fósseis Brasil
52. Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – SPVS
53. SOS Amazônia
54. Transparência Internacional – Brasil
55. Uma Gota No Oceano
56. WWF-Brasil

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Importadores voltam a ameaçar boicote caso Congresso aprove ‘PL da grilagem’ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/07/14/importadores-voltam-a-ameacar-boicote-caso-congresso-aprove-pl-da-grilagem/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/07/14/importadores-voltam-a-ameacar-boicote-caso-congresso-aprove-pl-da-grilagem/#respond Wed, 14 Jul 2021 20:56:39 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2020/05/Ibama.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=971 Com o ‘PL da grilagem’ de volta ao plenário da Câmara dos Deputados nesta quarta (14), podendo ser votado até o fim do dia, empresas internacionais reforçam o recado de que “se esta ou outras medidas que prejudicam proteções existentes se tornarem lei, nós não teremos escolha a não ser reconsiderar nosso apoio e uso da commodity agrícola brasileira na nossa cadeia de fornecimento”.

A mensagem já havia sido enviada em carta ao Congresso brasileiro em 5 de maio, assinada por 40 empresas, entre supermercados, indústria alimentícia e redes de restaurantes. Com o retorno do projeto ao plenário da Câmara, a carta ganhou nesta quarta (14) mais oito signatários, incluindo a marca de fast food Nando’s, fundada na África do Sul, e a associação da indústria alimentar holandesa Nevedi.

“Um ano atrás nós lhes escrevemos sobre nossa preocupação com a MP 910, reformada como PL 2633/2020, e ficamos animados com a decisão anterior de retirar a proposta”, diz a carta, que mostra o acompanhamento do trâmite legislativo brasileiro pelos atores internacionais.

O apelido ‘PL da grilagem’ acompanha duas propostas atuais de regularização fundiária, o PL 2633/2020, da Câmara dos Deputados, e o PL 510/2021, do Senado. Ambas alteram o marco temporal que autoriza a regularização fundiária de invasões recentes, o que na prática incentiva a grilagem de terras, sinalizando constante atualização dos prazos. Os projetos também diminuem as exigências para regularização e as verificações de campo.

Como a derrubada das árvores é usada por invasores para demarcar a posse do terreno, a grilagem de terras se tornou um dos principais motores do desmatamento na Amazônia. A imagem do agronegócio brasileiro fica implicada em possíveis elos com a grilagem e o desmatamento por conta da consolidação dessas ocupações, feitas majoritariamente através da criação de gado.

Em maio, o parlamento europeu também se posicionou contra o projeto através da vice-presidente da delegação para relações com o Brasil e membra do partido Verde alemão, Anna Cavazzini.  “Se o projeto de lei for aprovado, enviará um sinal à União Europeia de que o Brasil não está comprometido com o combate verdadeiro e efetivo do desmatamento, e isso tornaria impossível para o Parlamento Europeu ratificar o acordo com o Mercosul”, disse à Folha a eurodeputada.

Para a diretora de políticas da rede europeia de supermercados Co-op, Cathryn Higgs, “a Amazônia é essencial para a saúde planetária e se essa nova lei for introduzida, ameaçará a credibilidade das propostas de proteção ambiental da Amazônia.”

 

Confira a lista de empresas que assinam a carta contra o ‘PL da grilagem’:

Agricultural Industries Confederation (AIC)
Ahold Delhaize
Albert Heijn
ALDI Einkauf SE & Co. oHG
ALDI SOUTH Group
AP7 (Sjunde AP-fonden)
Aquascot Ltd.
Asda Stores Ltd.
BIAZA
The Big Prawn Company
British Retail Consortium
Centraal Bureau Levensmiddelenhandel (CBL)
C.I.V. Superunie B.A.
Congregation of Sisters of St. Agnes
Co-op Switzerland
The Co-operative Group
Cranswick plc
DNB Asset Management AS
Donau Soja
EdenTree Investment Management
Greggs plc
Hilton Food Group
Iceland Foods
Jumbo Supermarkten B.V.
KLP Kapitalforvaltning AS
Legal & General Investment Management
Lidl Stiftung
Marks & Spencer
METRO AG
Migros
Moy Park
Nando’s
National Pig Association
Nevedi – Dutch Feed Industry Association
New England Seafood International (NESI)
Ocado Retail
Pilgrim’s UK
ProTerra Foundation
Red Tractor Assurance
Retail Soy Group
J Sainsbury Plc
Skandia
Swedbank Robur Fonder AB
Tesco PLC
Waitrose & Partners
Winterbotham Darby
Wm Morrison Supermarkets Plc
Woolworths Group

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Investidores de R$ 21,8 trilhões pedem que bancos ajam sobre clima e biodiversidade https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/07/06/investidores-de-r-218-trilhoes-pedem-que-bancos-ajam-sobre-clima-e-biodiversidade/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/07/06/investidores-de-r-218-trilhoes-pedem-que-bancos-ajam-sobre-clima-e-biodiversidade/#respond Wed, 07 Jul 2021 01:50:30 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/07/Nv6WNADC-320x215.jpeg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=968 Um grupo de 115 investidores internacionais enviou nesta terça (6) uma carta a 63 bancos globais pedindo medidas sobre clima e biodiversidade.

Os signatários – entre eles, os grupos Aviva Investors, Fidelity International, Federated Hermes e M&G Investments – representam US$4,2 trilhões (R$ 21,8 trilhões) em aplicações.

A carta, ao qual o blog teve acesso, pede que os bancos se comprometam a eliminar o financiamento ao carvão até 2030 nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e até 2040 no restante do mundo.

O grupo também quer políticas para setores de alto impacto ambiental e sugere um alinhamento de expectativas sobre a gestão de riscos ligados à biodiversidade e aos direitos humanos. A carta pede que os bancos enviem respostas até 15 de agosto.

Na esteira de cobranças de políticas do governo brasileiro para a Amazônia e de corte de investimentos em empresas ligadas a desmatamento, a carta marca mais um gesto do setor financeiro no sentido de incorporar critérios socioambientais na análise de riscos dos investimentos – influenciados tanto por ameaças físicas das mudanças climáticas e da perda de biodiversidade quanto pela transição dos motores da economia global.

A carta destaca o papel da transição das energias fósseis para renováveis como principal estratégia para evitar as emissões de carbono, em vez de compensá-las com tecnologias de emissões negativas que, segundo o texto, devem receber “confiança mínima”.

O texto ainda pede que os bancos publiquem compromissos de curto prazo (cinco a dez anos) para clima e biodiversidade e considerem o risco climático em seus demonstrativos financeiros em todas as categorias de risco.

“Um grande banco internacional com uma presença geográfica significativa está exposto a uma série de riscos relacionados ao clima e à natureza, incluindo riscos físicos e de transição que podem ter um impacto significativo no valor dos ativos e passivos do banco. Como banco, você está em uma posição poderosa para conduzir a transição para o baixo carbono e enfrentar as piores consequências das mudanças climáticas e da perda de biodiversidade”, diz a carta, enviada aos maiores bancos globais, incluindo JP Morgan Chase, Deutsche Bank, Standard Chartered, Santander, HSBC e Goldman Sachs.

A articulação é da campanha Share Action, que ganhou notoriedade após classificar os fundos de pensão britânicos a partir de critérios de investimentos responsáveis.

“Palavras calorosas sobre a importância da biodiversidade não são suficientes. Os investidores querem ações concretas agora, e os bancos que falharem em responder podem esperar sérios desafios em sua próxima assembleia geral anual”, afirma a coordenadora da campanha, Jeanne Martin.

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O bêbado e o comunista https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/06/21/o-bebado-e-o-comunista/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/06/21/o-bebado-e-o-comunista/#respond Mon, 21 Jun 2021 04:44:34 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/WhatsApp-Image-2021-06-21-at-01.38.17-320x215.jpeg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=964 Para o filósofo francês Bruno Latour, “o escapismo é a principal ameaça no mundo. E, comparada a essa ameaça, todas as outras lutas convergem”.

Já a autora deste blog havia proposto que “é tempo de defender o óbvio, justamente porque não podemos mais contar com ele”. No entanto, para o empreendedor social Caetano Scannavino, uma ampla união em defesa de obviedades não bastará para responder ao negacionismo – da pauta climática à pandemia – promovido pelo governo. “Não será tentando contê-lo que vamos espantá-lo. É preciso ser mais louco que ele”.

“Como antítese a Bolsonaro, tem-se a oportunidade para acelerar a construção do verdadeiramente inovador e revolucionário”, defende Scannavino, em artigo publicado abaixo com exclusividade pelo blog.

A proposta sugere inovações ligadas a um desenvolvimento mais sustentável como saída imediata para as múltiplas crises do país, trazendo para o presente a chance de repensar paradigmas que já não dão conta de organizar a civilização.

Confira abaixo a íntegra do artigo.

O bêbado e o comunista

Por Caetano Scannavino*

– A Terra é plana! – chega o bebum.
– Que Terra plana que nada! A Terra é uma pirâmide! – retruca o comunista.
– Pirâmide? Você tá de porre! Qualquer um sabe que a Terra é redonda… – diz o bebum, já se afastando.

Não adianta subestimar, resistir ou argumentar com o bêbado chato na festa. A única forma de se livrar dele é se fazer ainda mais bebum. De dose dupla.

Em meio à terra arrasada ao longo do seu mandato, os que subestimam uma eventual reeleição de Bolsonaro só fazem bem a ele. Tampouco pode-se dizer que apenas uma frente ampla das oposições – os tais comunistas – bastaria para evitar uma recondução ao cargo por mais quatro anos.

É preciso deixar o rei nu.

Bolsonaro soube como ninguém se apropriar e manter o popularíssimo avatar antissistema, se aproveitando de uma sociedade com ojeriza do “mais do mesmo” da política e dos muitos que prometeram mudar o sistema e acabaram mudados por ele.

Vestido para matar, Bolsonaro veio para destruir, deixando para terceiros a tarefa do que colocar no lugar. Enquanto esgarça as instituições, lança como isca suas pérolas sem compromisso com a verdade ou o bom senso. As oposições mordem, sem que consigam ir além de resistir e reduzir danos.

E assim vai levando, com aquele ora mais ora menos terço de apoiadores – o suficiente tanto para desencorajar movimentos por impeachment, como para deixá-lo em 2022 com um pé no 2º turno – quando então se vangloriará do provável viés de “despiora” em relação à economia e à pandemia, após o fundo do poço alcançado neste ano.

Ainda que estes tempos nos tragam dificuldades de respirar, é preciso encontrar o oxigênio que nos foi cortado para inspirar mais do que união pela democracia – o que nos levaria a propor apenas a volta do que era.

As oposições que se dizem progressistas devem ser capazes de despir Bolsonaro desse avatar anti-establishment que opera milagres ao vender ares de inovação e mudanças a partir de ideias retrógradas e reacionárias, vindas de um congressista com quase 30 anos de baixo-clero, boa parte dele no PP de Paulo Maluf.

É hora de dobrar a aposta, como quando encontramos o bebum chato na festa. Não será tentando contê-lo que vamos espantá-lo. Teremos que extrapolar e ser mais louco que ele. Ser de fato progressistas.

Como antítese a Bolsonaro, tem-se aí a oportunidade para acelerar a construção do verdadeiramente inovador e revolucionário, ousando-se criar um novo establishment no lugar da terra arrasada.

Em vez de resistir ao chacoalhão das estruturas que criticávamos, temos a chance de reorganizá-las sob novos impulsos criadores. A crise pandêmica abriu ainda mais esta janela para adiantar o futuro e começar a pautá-lo desde já.

No campo trabalhista, por exemplo, ao invés de pararmos no tempo acomodados apenas na defesa da CLT de Vargas, os progressistas devem também chamar respostas para a inevitável substituição de vagas de trabalho por máquinas. Que tal trazer para a agenda o que já vem sendo debatido em países europeus, como a redução da jornada para 32 horas, com mais gente trabalhando, por menos tempo? Por sinal, uma medida cujos estudos apontam melhoras na mobilidade urbana, no clima, na conta de luz e na saúde, com a diminuição das faltas, sem comprometimento da produtividade.

O ajuste dos relógios ainda alavancaria a economia do lazer e da cultura, privilegiando o tempo para usufruir desses serviços ao invés de incentivar o consumismo material num planeta que não tem tido tempo – na correria que lhe impomos – para renovar seus recursos.

Os experimentos de redução da jornada de trabalho também se articulam com mecanismos de renda básica, associados a saídas inovadoras no campo previdenciário, com a expectativa de vida crescente. Que tal um Bolsa Família 2.0, mais robusto, numa mobilização nacional pela erradicação da extrema pobreza que garanta o mínimo para todos? A partir daí podemos criar uma competição mais justa no mundo do trabalho.

Que tal discutirmos o entendimento de empresas como entes de interesse público? A partir de exemplos como o Sistema B de “benefício”, ou o ESG, sigla em inglês para “ambiental, social, governança”? O debate nacional precisa incorporar esses pilares na análise dos investimentos, indo além das tradicionais métricas econômico-financeiras.

Ao invés de reprimir, que tal alavancar as iniciativas de economia compartilhada das favelas e comunidades rurais? Precisamos discutir as políticas públicas do futuro, que por vezes nascem nas margens e nas periferias, já denunciando o que não funciona no centro do sistema. Reunir essas inteligências também passa por fortalecer a participação social, os conselhos, os mecanismos de democracia direta, de proatividade cidadã na construção de políticas mais apropriadas às realidades dos que mais precisam delas.

No país líder em biodiversidade, em plena emergência climática global, a deixa está dada para contrapor um governo antiambientalista. Políticas de desmatamento zero, eficiência agrícola e polos industriais de biotecnologia e bioeconomia não só têm o potencial de movimentar trilhões de dólares para o país, como também pode nos posicionar na liderança da vanguarda mundial dos novos paradigmas de desenvolvimento.

Para sermos de fato progressistas, é preciso assumirmos a construção da agenda do futuro, que vai muito além dos exemplos acima e exige uma disposição imediata de ser mais louco que o bêbado, pautar ao invés de ser pautado e, assim, libertar-se da condição de refém de debates que param o país discutindo cloroquina ou voto impresso.

Se a melhor forma de prever o amanhã é construí-lo, essa é também a melhor estratégia para combater o exterminador do futuro: com mais doses de futuro.

*Caetano Scannavino é empreendedor social, coordenador da ONG Projeto Saúde & Alegria, com atuação na Amazônia.

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“Nenhum país vai dizer ao Brasil o que fazer com a Amazônia”, diz Al Gore https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/05/25/nenhum-pais-vai-dizer-ao-brasil-o-que-fazer-com-a-amazonia-diz-al-gore/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/05/25/nenhum-pais-vai-dizer-ao-brasil-o-que-fazer-com-a-amazonia-diz-al-gore/#respond Tue, 25 May 2021 19:53:39 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2021/05/15797024155e28588fdb8d2_1579702415_3x2_lg-320x215.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=954 “O que acontece na Amazônia brasileira depende do Brasil. Nenhum outro país vai dizer ao Brasil ou aos seus líderes o que fazer, mas espero que todos aceitem suas responsabilidades no nosso esforço global para resolver a crise climática”, disse o ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore, em evento virtual voltado ao público empresarial brasileiro nesta terça-feira (25), realizado pelo banco Santander em parceria com o jornal Valor Econômico.

Sem fazer referências diretas ao governo Bolsonaro, Al Gore reforçou o valor da soberania nacional, destacada nos discursos do presidente brasileiro, antes de ressaltar a importância global do bioma.

“A Amazônia tem implicações críticas para o ciclo hidrológico global. Altos níveis de desmatamento na Amazônia já estão causando significativa redução das chuvas no Sul”, citou Al Gore, em resposta à pergunta do diplomata colombiano e ex-presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luis Alberto Moreno, sobre as possibilidades de colaboração da comunidade internacional na área climática.

“O meu conselho, já que você perguntou, é que os líderes, no Brasil ou em outros lugares do mundo, considerem os territórios e as comunidades tradicionais ou indígenas ao desenvolver suas políticas climáticas e de biodiversidade. Eles protegem a biodiversidade mundial há gerações e é importante que tenham um lugar na mesa na tomada de decisão”, concluiu.

O americano contou ter recebido com otimismo as novas metas climáticas do Brasil, anunciadas pelo presidente Bolsonaro na Cúpula do Clima, organizada pelos Estados Unidos no último mês.

“Os Estados Unidos e o Brasil têm oportunidade de trabalhar juntos pelo clima, especialmente no momento em que o mundo se reconstrói economicamente após a pandemia”, afirmou.

Al Gore também disse estar orgulhoso da gestão Biden pela prioridade dada à pauta climática. “Não há substituto para o papel de liderança global dos EUA nessa questão”, disse em referência à responsabilidade histórica do país pelas emissões de gases-estufa.

Após ter sido vice-presidente da gestão Clinton de 1993 até 2000, ano em que disputou a presidência e perdeu para Bush em polêmica contagem dos votos, Al Gore se tornou uma das vozes mais importantes da questão climática no mundo.

Em 2007, venceu o Oscar de melhor documentário com o filme Uma verdade inconveniente. No mesmo ano, dividiu o prêmio Nobel da Paz com o painel científico da ONU sobre mudanças climáticas, o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas).

“Um estudo recente mostrou que proteger 30% da biodiversidade global em áreas marítimas e terrestres aumentaria o retorno econômico em uma média de US$ 250 bilhões (R$ 1,3 trilhão)”, defendeu Al Gore na palestra, que também citou a necessidade de colocar um preço no carbono, com iniciativas como o mercado de créditos de emissão de carbono.

Em um discurso recheado de dados sobre as oportunidades econômicas do que ele chama de revolução sustentável, o americano citou os investimentos ESG (com critérios ambientais, sociais e de governança, na sigla em inglês) como uma tendência que era alternativa e já se tornou convencional.

Ele também afirmou que o Brasil é líder global na transição para fontes de energias renováveis, com os custos mais baixos do mundo para a implantação de energia eólica. “Hoje investir em uma nova planta de eólica no Brasil é mais barato do que manter uma termelétrica a carvão em operação”, afirmou.

Ao argumentar sobre a tendência de aumento dos investimentos em soluções climáticas, movimento que ele considera irreversível, citou como exemplo a resistência de setores da sociedade americana que se organizaram para persistir nos compromissos climáticos durante o governo Trump, contrário à agenda.

“Mesmo na ausência de liderança federal nos Estados Unidos nos quatro últimos anos, uma coalizão de empresas e governos estaduais e locais formaram o We are still in (“nós ainda estamos dentro) e se comprometeram com o progresso das metas climáticas”.

O movimento também inspirou reações brasileiras desde a eleição de Bolsonaro, em 2018, quando o ambientalista Alfredo Sirkis – que também representava as ações de Al Gore no Brasil até seu falecimento, no ano passado – passou a reunir os governadores estaduais em torno de compromissos com a agenda climática, em contraposição ao afrouxamento das políticas ambientais em curso no governo federal.

Al Gore e Bolsonaro se encontraram no início do ano passado durante o fórum econômico de Davos. O momento, registrado pelo filme O Fórum, mostra Al Gore afirmando ser um grande amigo de Sirkis e dizendo que estão todos preocupados com a Amazônia. Bolsonaro responde que foi um inimigo de Sirkis e que gostaria de explorar a Amazônia junto com os Estados Unidos.

“Eu não entendi o que você quer dizer”, respondeu Al Gore, em uma cena que se popularizou nas mídias sociais e foi recebida pelo público como um momento constrangedor para o governo brasileiro.

 

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