Ambiência https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br O que está em jogo na nossa relação com o planeta Fri, 03 Dec 2021 21:06:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 PL no Senado pode induzir 53 mil km² de desmate com apenas uma obra, diz estudo https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/11/23/pl-no-senado-pode-induzir-53-mil-km%c2%b2-de-desmate-com-apenas-uma-obra-diz-estudo/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2021/11/23/pl-no-senado-pode-induzir-53-mil-km%c2%b2-de-desmate-com-apenas-uma-obra-diz-estudo/#respond Tue, 23 Nov 2021 10:57:46 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/09/Folhapress-320x215.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=1030 Obras planejadas pelo governo federal podem disparar o desmatamento nos próximos anos, caso as condições para o licenciamento ambiental sejam flexibilizadas, como propõe o PL nº 2.159/2021, que tramita no Senado e pode ser votado nesta semana.

O apontamento foi feito em duas notas técnicas produzidas pelo ISA (Instituto Socioambiental) em parceria com a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Através de modelos matemáticos, elas calculam uma explosão do desmatamento ligado a empreendimentos como a Ferrogrão e a BR-319, exemplos de obras que já são planejadas e devem ser dispensadas de responsabilidade pelo desmatamento caso o projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental seja aprovado pelo Senado.

A principal preocupação apontada no estudo é a vedação expressa feita pelo projeto de lei a condicionantes para a emissão da licença (como medidas de prevenção, mitigação e compensação de impactos ambientais).

O artigo 13 do projeto de lei, aprovado pela Câmara dos Deputados em maio, veda o estabelecimento de condicionantes ambientais sobre impactos causados por terceiros e sobre os quais o poder público detenha o poder de polícia.

“Como o combate ao desmatamento e demais atividades ilegais na Amazônia consistem em competência – e dever constitucional – inserida no âmbito do poder de polícia estatal, além de ser atividade realizada por ‘terceiros’, decorre que não mais poderão ser objeto de condicionantes ambientais quaisquer medidas para conter o desmatamento decorrente da instalação de empreendimentos de impacto, como estradas, ferrovias, hidrelétricas e outros”, afirma a nota técnica.

O projeto da Ferrogrão, ferrovia que deve ligar municípios produtores de soja a partir de Sinop (MT) até a região portuária de Mirituba (PA), pode gerar “desmatamento de 53.113,5 km² em floresta nativa no interior da bacia sua logística entre os anos de 2019 a 2030”, calcula o estudo.

O motor do desmate seria conversão de áreas de florestas e savana para o uso agrícola, já que 57% da vegetação nativa verificada na bacia logística do projeto ferroviário está em áreas com alta aptidão para o cultivo de soja.

Outra obra analisada pelo estudo é a pavimentação da BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO) e pode elevar o desmatamento anual no estado do Amazonas ao patamar de 9,4 mil km² em 2050. Entre 2015 e 2020, o desmate médio anual no estado foi de 1.150 km².

No caso da BR-319, a própria rodovia daria passagem ao desmatamento, facilitando o acesso a áreas preservadas. Cerca de 95% do desmatamento e 85% das queimadas na Amazônia se concentram em uma distância de até 5 km de estradas, diz a nota, a partir de dados publicados em 2014 nas publicações científicas Biological Conservation e International Journal of Wildland Fire.

“Com o asfaltamento e sem medidas controle do desmatamento, as emissões acumuladas de carbono também mais que quadruplicariam em relação ao cenário previsto sem a pavimentação, alcançando 8 bilhões de toneladas – equivalente à emissão de 22 anos de desmatamento na Amazônia Legal com base na taxa de 2019”, diz a nota.

“Ao tornar o licenciamento ambiental exceção e inviabilizar a adoção de condicionantes ambientais para prevenir a supressão ilegal de vegetação, o projeto de lei resultará no aumento do desmatamento da Amazônia Legal em níveis que impedirão o Brasil de cumprir suas metas assumidas no Acordo de Paris”, conclui.

O projeto que tramita no Senado prevê treze dispensas de licenciamento, além da criação de uma licença automática, sem avaliação prévia por parte do órgão ambiental, para a maioria das atividades impactantes para o meio ambiente, classificadas como de “significativo impacto ambiental”.

Apenas a minoria dos empreendimentos, classificados como de “significativo potencial degradador”, passariam pelo licenciamento com avaliação prévia de órgão ambiental.

De acordo com esse critério, 85,6% dos projetos de atividades minerárias e suas barragens em Minas Gerais passariam a obter licença automática, calcula a segunda nota técnica emitida pelo ISA e a UFMG.

“[O projeto de lei] ampliará sobremaneira os riscos de proliferação de novos desastres socioambientais, como as tragédias ocorridas em Mariana (MG) e Brumadinho (MG)”, conclui o estudo.

Relatora do projeto, a senadora Kátia Abreu (PP-TO) confirmou que a matéria pode ir à votação no plenário do Senado nesta semana, mas disse que ainda vai tentar finalizar o texto.

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Sob protestos, Salles acaba com proteção a restingas e manguezais https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2020/09/28/sob-protestos-salles-acaba-com-protecao-a-restingas-e-manguezais/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2020/09/28/sob-protestos-salles-acaba-com-protecao-a-restingas-e-manguezais/#respond Mon, 28 Sep 2020 17:05:24 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2020/09/conama-320x215.png https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=831 Presidido pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) aprovou nesta segunda-feira (28) a revogação de suas resoluções 302 e 303, que estabeleciam critérios para a preservação de áreas litorâneas de manguezais e restingas, assim como áreas em torno de reservatórios de água, como mananciais urbanos.

A resolução 303 determinava quais as Áreas de Preservação Permanente (APP) nas faixas litorâneas, protegendo toda a extensão dos manguezais e delimitando como APPs as faixas de restinga “recobertas por vegetação com função fixadora de dunas ou estabilizadora de mangues”. Sua revogação beneficia o setor imobiliário nas praias de restinga e a carcinicultura, principalmente no litoral do Rio Grande do Norte.

Já a resolução 302 estabelecia uma faixa mínima de 30 metros de proteção ao redor de reservatórios artificiais, como são exemplos as represas Billings, Guarapiranga e Cantareira, em São Paulo.  A revogação libera essas áreas para habitação e usos econômicos, o que poderia colocar em risco a segurança das áreas e também a qualidade das águas.

O conselho também revogou a resolução 284, que submetia projetos de irrigação ao processo de licenciamento ambiental. Entre as implicações ambientais da irrigação, está a competição pelo abastecimento de água e também o risco de contaminação por agrotóxicos. A agropecuária usa 72% da água consumida no Brasil, segundo dados da da FAO, agência de alimentação e agricultura da ONU.

A reunião aprovou ainda uma nova resolução que permite a queima de resíduos de poluentes orgânicos persistentes – como pesticidas, inseticidas e fungicidas usados na agricultura – em fornos de produção de cimento.

Altamente tóxicos, persistentes no ambiente e bioacumulativos (ou seja, não são eliminados pelo nosso organismo), esses poluentes estão ligados a disfunções hormonais, imunológicas, neurológicas e reprodutivas.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, sua queima não-controlada, sob temperatura inadequada ou com combustão incompleta pode gerar subprodutos ainda mais tóxicos.

As revogações contaram com aprovação ampla do colegiado, formado majoritariamente por representantes do governo federal e das associações do setor privado – as confederações nacionais da indústria (CNI) e da agricultura (CNA), que também foram proponentes das revogações.

Registraram voto contrário a todas as revogações o estado do Piauí e as duas ONGs presentes na reunião – o Instituto Internacional de Pesquisa e Responsabilidade Socioambiental Chico Mendes e a Associação Novo Encanto de Desenvolvimento Ecológico.

O estado do Rio Grande do Sul também registrou voto contrário a duas das três revogações. O secretário de meio ambiente do estado, Artur Lemos Júnior, argumentou que a norma sobre licenciamento para irrigação deveria ser alterada, e não revogada.

O secretário também defendeu que a resolução 303, que trata da proteção de áreas de manguezal e restinga, fosse alterada para se adaptar ao que foi estabelecido pelo Código Florestal, mantendo critérios específicos que não haviam sido atendidos pela legislação.

“Estamos partindo de uma guerra fiscal para uma guerra ambiental, pois em alguns estados vai ser mais restritivo e, em outros, não”, pontuou Lemos, em defesa da manutenção da resolução.

“Não seria mais adequado facultar aos órgãos estaduais estabelecer seus critérios técnicos, em vez de um critério genérico, que pode ser pertinente para algumas localidade e impertinente para outras?”, Salles perguntou ao secretário, que devolveu um exemplo.

“Nosso receio é: em estados do Nordeste, o Rio Grande do Norte principalmente, tem empreendimento eólicos quase que em cima de dunas. Aqui no Rio Grande do Sul, por sermos mais protetivos e sob a legislação vigente, entendemos que não [poderia haver a instalação]. E aí passamos a perder esses investimentos aqui no Rio Grande do Sul”, respondeu.

Carlos Teodoro Irigaray, representante da Associação Novo Encanto, marcou a oposição durante a reunião em argumentações contrárias a cada revogação. Ele também criticou a ausência de consideração de aspectos técnicos nos pareceres jurídicos. “Forno de cimento é desenhado para produzir cimento, não pra queimar resíduos perigosos”, pontuou.

O Ministério Público Federal, único membro sem direito a voto, também participou da reunião. “O MPF vai ajuizar ação pra anulação das decisões aqui tomadas, que ferem a lei e os princípios constitucionais”, disse a conselheira e procuradora regional da 3a região, Fátima Borghi.

Diante de críticas e pedidos de vistas durante a reunião, Salles chegou a propor o adiamento da votação, que foi recusado pela maioria.

As revogações atendem a diversos setores econômicos, como a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que aparece nos documentos do Conama como requerente da anulação do licenciamento ambiental para projetos de irrigação.

Também se beneficiam do revogaço o setor imobiliário, com a liberação de áreas de preservação de restinga para construção de hotéis à beira-mar; a carcinicultura, com a queda da proteção para áreas de manguezais e também o setor de resíduos, que ganha facilidades para queima de poluentes em fornos de produção de cimento.

O Conama perdeu representação das organizações da sociedade civil – cujos assentos no conselhos passaram de 23 para quatro – e também dos estados – que passaram de 27 para cinco cadeiras, ainda no início do governo Bolsonaro, quando o governo federal e o setor privado passaram a compor a maioria do colegiado.

Protestos

Ainda no domingo (27), os deputados petistas Nilto Tatto (SP), Enio Verri (PR) e Gleisi Hoffmann (PR) haviam ingressado com uma ação popular preventiva na Justiça Federal pedindo, em tutela de urgência, a suspensão da reunião ou, não havendo tempo hábil para a decisão, a anulação das decisões tomadas pelo colegiado.

Já na manhã desta segunda, promotores do Ministério Público reunidos pela Abrampa (Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente) enviaram ofício ao ministro Ricardo Salles contra a revogação das resoluções, apontando “vícios de ilegalidade, que desdobrariam em galopante processo de judicialização, em detrimento da segurança jurídica e em prejuízo de toda a sociedade”.

“Qualquer decisão sobre a revogação de resolução do Conama deve ser precedida de participação de todos os setores envolvidos”, diz o ofício, que também aponta a necessidade de estudos sobre impactos regulatórios.

A Ascema, Associação Nacional dos Servidores de Meio Ambiente, defendeu em nota o julgamento imediato de ação contra a alteração na composição do Conama, que foi impetrada pela Procuradoria Geral da República no Supremo Tribunal Federal ainda no início do ano passado.

Os servidores também defendem, alternativamente, que o Congresso aprove  o projeto de decreto legislativo do deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), que susta os efeitos do decreto presidencial que instituiu as mudanças no órgão colegiado. No início do governo Bolsonaro, o Conama perdeu representação das organizações da sociedade civil e dos governos estaduais e municipais.

A Liga das Mulheres pelos Oceanos, rede formada por especialistas, publicou nota técnica contrária à revogação da resolução 303, que retira a proteção de manguezais e restingas, destacando que esses ecossistemas são “proteção natural à nossa linha de costa, servindo como anteparos para o avanço das marés e contra a erosão costeira”.

A nota também afirma que as perdas de manguezais devem afetar a fauna do bioma e retirar a proteção das pradarias marinhas e dos recifes de coral, impactando as comunidades costeiras e até mesmo as atividades pesqueiras comerciais.

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Ibama flexibiliza cumprimento de obrigações ambientais durante pandemia https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2020/04/03/ibama-flexibiliza-cumprimento-de-obrigacoes-ambientais-durante-pandemia/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2020/04/03/ibama-flexibiliza-cumprimento-de-obrigacoes-ambientais-durante-pandemia/#respond Fri, 03 Apr 2020 23:40:25 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/04/bim-320x215.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=642 Em comunicado publicado nesta sexta-feira (3), o Ibama altera diretrizes do cumprimento de obrigações ambientais de atividades e empreendimentos licenciados pelo órgão durante a pandemia causada pelo coronavírus. As medidas devem ser mantidas pelas empresas “na medida do possível”, segundo o documento.

O texto prioriza a manutenção de medidas ligadas a impactos diretos ao ambiente – cujo não-cumprimento deve ser comunicado por e-mail ao Ibama.

No entanto, a avaliação sobre a continuidade de medidas relativas a impactos indiretos ao ambiente ficariam, conforme sugere o texto, a critério do empreendedor.

“O cumprimento das medidas de monitoramento e minimização de impactos que não possuem natureza imediata e direta com a prevenção e minimização dos impactos ambientais deve ser avaliado e ajustado se necessário, tendo-se como norte um esforço pela não-interrupção das obrigações”, diz o comunicado.

Na interpretação de dois especialistas em licenciamento ambiental, ouvidos pelo blog sob condição de anonimato, o comunicado transfere ao empreendedor a responsabilidade de avaliação sobre a continuidade do cumprimentos da suas obrigações, o que antes era feito pelo Ibama.

No procedimento padrão, o empreendedor solicita ao órgão fiscalizador o adiamento ou a suspensão de obrigações ambientais que não possam ser cumpridas. Cabe ao Ibama, no caso do licenciamento federal, avaliar cada caso e autorizar o empreendedor a seguir ou interromper cada atividade condicionante da sua licença, conforme sua solicitação.

“A dúvida fica na delegação ao empreendedor para decidir o que o vai ser implementado. O pagamento de uma indenização pode ser afastado num quadro como o atual?”, questiona Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista em políticas públicas do Observatório do Clima.

No entanto, segundo o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, “nada mudou”.

Bim afirmou ao blog que o Ibama analisará cada caso comunicado ao órgão para dizer se um não-cumprimento é cabível ou não.

“É por conta e risco do empreendedor. É claro que ele vai fazer essa avaliação e comprovar isso [que há relação entre o não-cumprimento e a pandemia]. Se a gente não aceitar, ele vai ser autuado e provavelmente terá que fazer compensação.”

Segundo a advogada ambiental Letícia Marques, o comunicado não dá garantias de que o descumprimento de obrigações ambientais estará isento de sanções.

Ela destaca trecho do documento que diz “o órgão considerará as circunstâncias e a causa de eventuais não cumprimentos antes de inferir sobre qualquer penalidade administrativa, reforçando a ciência da excepcionalidade do momento atual”.

“Orientei meus clientes a documentar dificuldades para depois o Ibama rever”, ela afirmou.

Outro ponto questionado por especialistas é a prioridade dada a condicionantes ligadas a impactos ambientais diretos, em detrimento dos indiretos. Segundo especialistas, a depender do tipo de empreendimento licenciado, o tratamento de impactos indiretos pode ser fundamental para conter danos ambientais.

“Impõe-se verificar se as medidas que devem ser mantidas englobam os principais impactos dos diferentes tipos de empreendimentos licenciados pelo Ibama. Será que essas medidas gerais vão englobar os principais impactos a ponto de não haver danos ambientais?”, questiona a ex-presidente do Ibama.

Ainda conforme especialistas, o comunicado do Ibama guarda aspectos em comum com propostas em negociação na Câmara dos Deputados para a Lei Geral de Licenciamento, como a priorização de medidas de impactos diretos e a transferência de atribuições para o empreendedor fazer sua própria avaliação de suas obrigações ambientais.

Uma medida mais resoluta foi tomada pela agência de proteção ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês). Na última semana, a agência americana anunciou que não aplicará multas “por não conformidades com as obrigações rotineiras de monitoramento e relatórios, resultantes do COVID-19”.

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Kim Kataguiri troca licença ambiental do agro por Cadastro Ambiental Rural https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2019/07/19/kim-kataguiri-troca-licenca-ambiental-do-agro-por-cadastro-ambiental-rural/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2019/07/19/kim-kataguiri-troca-licenca-ambiental-do-agro-por-cadastro-ambiental-rural/#respond Fri, 19 Jul 2019 12:12:27 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/07/kim-320x215.jpg https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=322 O setor agropecuário, que defendia para si a isenção de licenciamento ambiental, conseguiu uma saída criativa no projeto da Lei Geral de Licenciamento.

“O agro, as ONGs e os órgãos licenciadores não vêem problema em fazer o licenciamento via CAR [Cadastro Ambiental Rural]”, afirmou o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), relator do projeto no grupo de trabalho que prepara o texto para ir ao plenário da Câmara em agosto.

O relatório de Kataguiri foi concluído na noite desta quinta (18) e obtido em primeira mão pelo blog, que conversou com o parlamentar por telefone.

O processo para obtenção do CAR, previsto no novo Código Florestal, inclui a checagem de informações prestadas pelo proprietário rural, através de georreferenciamento, e a regularização ambiental das propriedades.

No entanto, a saída leva para o Ministério da Agricultura e Pecuária a responsabilidade de licenciar ambientalmente as atividades do agro, já que o Serviço Florestal Brasileiro (órgão responsável pela realização do CAR) havia sido transferido do Meio Ambiente para a Agricultura no início do ano.

Embora o mecanismo seja uma aposta bem avaliada por ruralistas e ambientalistas, a implementação do CAR enfrenta dificuldades e insegurança jurídica em um contexto de constantes disputas na Justiça e também no Congresso, que continua debatendo novas mudanças no Código Florestal aprovado em 2012.

O texto de Kataguiri prevê que, enquanto o CAR não for validado pelo órgão competente, a simples inscrição no CAR já tem efeitos de licença, “ainda que haja déficit de vegetação nativa na propriedade ou posse rural”.

Ao mesmo tempo, o Congresso analisa a medida provisória 884, que acaba com o prazo para o cadastro ambiental e para adesão à regularização ambiental.

Confira abaixo os principais destaques do projeto.

Prazos rígidos, processos flexíveis

O texto define prazos objetivos para todos os órgãos licenciadores, incluindo esferas estaduais e municipais. Por outro lado, os licenciamentos de competência estadual poderão ter seus procedimentos definidos pelos estados.

A flexibilidade foi criticada por organizações ambientalistas durante as audiências públicas, sob o argumento de que poderia gerar uma guerra fiscal ambiental, em que os estados seriam incentivados a diminuir exigências para atrair empreendimentos.

Para Kataguiri, o problema só existiria se houvesse a possibilidade de dispensa de licenciamento. “A lista positiva do Conama [que define que tipos de atividades exigem licenciamento estadual] impede a dispensa de licença [pelos estados]”, disse o deputado.

Pressa

Com 48 menções à palavra “prazo” e 12 menções à palavra “risco”, o texto de 41 páginas prioriza o estabelecimento de períodos máximos para a emissão de licenças e a simplificação de processos, estipulando que solicitações sejam respondidas em até 30 dias.

As licenças mais complexas, que exigem estudo de impacto ambiental, devem sair em até oito meses.

Autodeclaração

Empreendimentos considerados pelos órgãos ambientais como de baixo impacto ambiental ou baixo risco (o texto não diferencia os dois termos) poderão se autolicenciar através da licença por adesão e compromisso (LAC) – uma declaração do empreendedor sobre a viabilidade do empreendimento. O documento deve ser expedido pelos órgãos licenciadores em até 45 dias.

“Órgãos precisam de mais estrutura”

Para Kataguiri, a licença expressa para empreendimentos de baixo impacto é uma forma de concentrar esforços dos órgãos licenciadores em obras de alto impacto, que exigem estudo de impacto ambiental e licenciamento mais complexo, em três fases.

“Órgãos licenciadores precisam de mais estrutura”, afirma Kataguiri. No final do texto, o projeto de lei estipula que os órgãos reportem aos chefes do Executivo, incluindo o presidente da República, “sobre as condições de recursos humanos, financeiros e institucionais necessários para o cumprimento desta lei”. Os chefes terão 90 dias para responder aos órgãos sobre “o atendimento ou não das condições apresentadas.”

“Ouvir todos, o mais rápido possível”

“Uma das principais preocupações era sobre o risco de judicialização [no processo de licenciamento]. Fui convencido de que isso se soluciona ouvindo todos, o mais rápido possível”, afirma Kataguiri.

O projeto prevê a realização de uma audiência pública para licenciamentos que exijam estudo de impacto ambiental. O evento deve acontecer no início do processo, antes da elaboração do termo de referência.

Consultas públicas devem durar de 15 a 60 dias e não poderão alterar os prazos das autoridades para responderem sobre a emissão da licença.

Indígenas devem ser consultados

Entre as preocupações de organizações ambientalistas levantadas em audiências públicas e que foi incorporada pelo texto do relator está a inclusão da consulta “a povos indígenas e tribais” nos processos de licenciamento que afetem seus territórios, conforme estabelecido pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Outras autoridades

A decisão sobre a emissão de licença continua desvinculada da manifestação de outros órgãos, como o Instituto do Patrimônio Artístico Nacional (Iphan) e a Fundação Nacional do Índio (Funai).

No entanto, o projeto estabelece que a autoridade licenciadora deve responder aos órgãos consultados e justificar sua decisão, permitindo ainda uma réplica antes da decisão final.

Concessão aos ambientalistas

Outra crítica ouvida nas audiências públicas foi sobre os critérios que definem o que gera impacto ambiental. Para especialistas, a definição sobre o grau de impacto de uma atividade deve considerar não só o tipo de empreendimento, mas também a região onde ele é planejado.

Antes focado nos critérios de “natureza, porte e potencial poluidor” da atividade, agora o texto passa a admitir que os critérios podem considerar “a relevância e a fragilidade ambiental da região de implantação”.

Exploração na zona costeira

O projeto acaba com a obrigação de realização de estudo de impacto ambiental para atividades nas zonas costeiras, ao revogar esse parágrafo do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro.

O texto também procura garantir a ocupação e exploração de apicuns e salgados, que são áreas costeiras onde a exploração de carcinicultura marinha é permitida – diferentemente dos manguezais, que são Áreas de Proteção Permanente (APP). Tramita na Câmara um projeto de lei para integrar os dois ecossistemas às APPs.

Votação em agosto

Segundo Kataguiri, o relatório será debatido com parlamentares do grupo de trabalho até a volta do recesso. “Minha preocupação pessoal é de não deixar que a legislação seja desfigurada por mudanças de última hora no plenário”, disse.

 

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Governos insistem em afrouxar licenciamento, a melhor vacina contra desastres ambientais https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2019/01/25/governos-insistem-em-afrouxar-licenciamento-a-melhor-vacina-contra-desastres-ambientais/ https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2019/01/25/governos-insistem-em-afrouxar-licenciamento-a-melhor-vacina-contra-desastres-ambientais/#respond Fri, 25 Jan 2019 22:38:52 +0000 https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/files/2019/01/divulgação-bombeiros-150x150.jpg http://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/?p=107 Existe uma vacina contra desastres ambientais e ela está prevista na Constituição. É o licenciamento ambiental. A tragédia de Mariana mostrou ao país para que ele serve: dar segurança à população, ao entorno e também ao empreendedor.

A repetição da tragédia na mesma região, sob responsabilidade da mesma empresa, acende ainda outro alerta: a fiscalização continuou precária. A falta de investimentos e de recursos técnicos para os órgãos ambientais não apontam melhora nesse quadro.

Por outro lado, nos três anos que separam os desastres de Brumadinho e Mariana, o Congresso Nacional tramitou pelo menos quatro propostas de flexibilização do licenciamento ambiental, motivado por lobbies do agronegócio e da indústria.

Uma delas ganhou o apelido de “PEC da Samarco” por ter chegado ao plenário do Senado apenas seis meses após a tragédia de Mariana. Segundo a proposta de emenda à Constituição, a apresentação de um estudo de impacto ambiental já seria suficiente para se autorizar a execução de uma obra – independentemente dos resultados do estudo.

Outro projeto de lei, do então senador Romero Jucá (MDB-RR), pedia facilitação do licenciamento de obras consideradas ‘estratégicas para o país’. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) também elaborou sua proposta para flexibilização do licenciamento, como a Folha revelou na época.

A articulação que mais avançou foi a da Lei Geral de Licenciamento Ambiental (PL 3729/2004). Apelidada de “licenciamento flex”, a proposta dispensava o agronegócio do processo e previa o licenciamento automático para obras consideradas de baixo impacto ambiental – o que não inclui o setor da mineração. Arquivados no fim da legislatura, os projetos podem ser recuperados para tramitação no Congresso a partir de fevereiro, com a volta do recesso parlamentar.

O entendimento do atual ministro do Meio Ambiente, no entanto, é mais preocupante que a proposta do Congresso. Há duas semanas, ele defendeu em reunião com o Secovi (Sindicato da Habitação) em São Paulo que o licenciamento de obras também poderia ser obtido com uma “autodeclaração”. A proposta é de que o próprio empreendedor se declare em conformidade com a lei, sujeitando-se a uma fiscalização posterior.

Ricardo Salles, hoje à frente do Ministério do Meio Ambiente, já havia proposto a autodeclaração como documento equivalente à licença quando foi secretário estadual de meio ambiente em São Paulo. Em outubro de 2016, chegou a encomendar à Cetesb a revisão do decreto que versa sobre o tema e propôs que o próprio empreendedor ateste pela internet, na página da Cetesb, que leu e se comprometeu com os termos. Segundo ele, a autodeclaração conta com “a presunção da boa fé”.

A flexibilização do licenciamento gerou críticas de ambientalistas por diminuir as garantias de integridade ambiental e ainda por incentivar uma ‘guerra fiscal’ entre os governos dos estados, que poderiam disputar a diminuição das exigências estaduais para licenciamento ambiental, a fim de atrair investimentos.

Na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, também chegou a tramitar na última legislatura um projeto de lei de iniciativa popular (PL 3676/2016) estabelecendo regras mais rigorosas para o licenciamento e a fiscalização das barragens. O projeto tem como base a Política Nacional de Segurança de Barragens – que existe desde 2010 e merece ser levada a sério pelo governo que garante, lá fora, conciliar meio ambiente e desenvolvimento.

Entender o licenciamento como prevenção de desastres é o primeiro passo para levar a sério o processo, que é de interesse público e também deveria estar entre as preocupações dos que empreendem e investem. Desafiado a dar uma resposta mais firme para Brumadinho do que houve para Mariana, o novo governo deverá compreender que a presunção de boa fé sem a vacina do licenciamento é apenas falta de cautela.

 

Como funciona o licenciamento ambiental

Falta de recursos em órgãos ambientais ajuda a explicar a demora na concessão da licença e a precariedade da fiscalização.

Passo a passo

1 – Empreendedor apresenta pedido de licença às autoridades.

2 – Órgão licenciador define qual estudo de impacto ambiental deve ser apresentado.

3 – Empresa apresenta estudo de impacto ambiental.

4 – Para alguns tipos de obras, deve se realizar audiência pública com população impactada e especialistas.

5 – Órgão analisa concessão da licença.

Tipos de licença

Única – para obras de baixo impacto ambiental

Trifásica – para obras de alto impacto; consiste em licença prévia, de instalação e de operação.

Depois da licença

Empreendedor –  deve apresentar relatórios sobre o cumprimento das condicionantes ambientais da obra.

Órgão ambiental – deve fiscalizar o cumprimento das condicionantes ambientais.

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