Saída do Acordo de Paris tem mais impactos para o Brasil do que para os EUA, dizem diplomatas

Os anúncios feitos por Bolsonaro sobre possível desembarque do Acordo de Paris têm repercutido na  COP-24 do clima, que busca regulamentar o acordo climático. No entanto, o impacto é diferente do que foi gerado pelo anúncio de Trump, que já prometia deixar o acordo em 2016.

Enquanto os diplomatas de outras delegações aguardam a chegada de um próximo governo americano que volte a contribuir com o financiamento climático, o desengajamento brasileiro gera desconfiança de que o país aumente suas emissões de carbono, principalmente com retrocessos na proteção da Amazônia.

Bolsonaro indicou neste domingo (9) seu ministro do meio ambiente, o ex-secretário estadual de meio ambiente de São Paulo, Ricardo Salles. 

Além de críticas por ter contra si ação de improbidade administrativa na gestão estadual, o nome também gerou alívio entre participantes da COP-24 que temiam indicação de Ricardo Felício — famoso por declarações céticas sobre o aquecimento global e que chegou a ser cogitado por Bolsonaro na última semana.

Mas a principal preocupação de ambientalistas era — e continua sendo— a de uma possível submissão da pasta ambiental ao Ministério da Agricultura.

Delegações da COP-24 também citaram preocupação com ação climática na prática quando questionadas sobre o novo governo brasileiro. Um dos diretores da agência de mudanças climáticas da ONU afirmou que garantir a proteção da Amazônia seria mais importante que ficar no Acordo de Paris.

“O Brasil é mais dependente do governo federal para cumprir suas metas climáticas do que os Estados Unidos”, lembra o secretário-executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl.

Enquanto nos Estados Unidos a transição energética e a diminuição das emissões de gases-estufa são tocadas por empresas e governos locais, o Brasil depende do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama para políticas de controle ambiental, já que tem nos setores de florestas e agropecuária o principal vetor de emissão de gases-estufa.

“O Brasil é um dos países que mais teria a ganhar com o acordo, com potencial de liderar a agenda climática”, diz Joseph Robertson, observador americano das negociações e diretor da ONG Citizens’ Climate Lobby.

A saída brasileira do acordo implicaria em perda do status de liderança internacional na agenda climática; já a ausência dos Estados Unidos é sentida “no bolso” das negociações, conforme avaliação de diplomatas das delegações da União Europeia, dos Estados Unidos e do Brasil.

País desenvolvido e maior emissor histórico de gases-estufa, os Estados Unidos estão entre os responsáveis por contribuir com o financiamento das metas do Acordo de Paris. O Brasil, por outro lado, está entre os que podem receber dinheiro para implementar suas metas.

Observadores na COP relatam que a postura dos dois países nas negociações não mudaram com as trocas presidenciais, já que as equipes de diplomatas são as mesmas e mantêm suas relações com outras delegações, tratando o assunto como “questão de Estado e não de governo”.

Os impactos econômicos da saída de Paris também devem ser mais sentidos no Brasil do que nos Estados Unidos — que figura no topo da economia mundial. Diplomatas e observadores ouvidos pelo blog ressaltam que o Brasil precisa do ‘selo de compromisso ambiental’ para a exportação dos produtos do agronegócio a mercados consumidores exigentes, como o Japão e a União Europeia.

Na véspera da COP-24, o presidente francês Emmanuel Macron lembrou que os negócios de seu país com o bloco do Mercosul estariam condicionados ao compromisso com o Acordo de Paris.

A futura ministra da Agricultura, a deputada federal Tereza Cristina (DEM-MS) também havia afirmado à Folha, em novembro, que o Acordo de Paris “é importante para a imagem de ‘produtor preservador’ do agronegócio brasileiro”.

Na manhã desta segunda (10), parlamentares, assessores do Ministério da Agricultura e representantes de associações de produtores realizam na COP-24 mais uma edição do evento Plataforma Biofuturo, no qual o país tenta promover os biocombustíveis como solução de curto prazo para a transição energética proposta no Acordo de Paris.