Doria confirma biodiversidade sob comando da Agricultura e servidores protestam

Foi publicada nesta quarta (13) a primeira resolução conjunta que detalha a transferência de atribuições da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (Sima) para a Secretaria da Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo. A mudança foi antecipada pela Folha na segunda-feira (11).

Na terça (12), servidores protestaram com cartazes em frente ao prédio da Sima, diante da publicação do decreto 64.131/2019 assinado pelo governador Doria no mesmo dia com o anúncio da mudança de atribuições entre as pastas.

Para Maíra Formis de Oliveira, presidente da Associação dos Especialistas Ambientais do Estado de São Paulo (AEAESP), a resolução “deixa agendas rachadas e pode trazer ineficiência aos processos”.

Ela também alerta que projetos executados pela coordenadoria de biodiversidade não foram mencionados na resolução, como o Cadmadeira, cadastro de comerciantes de madeira nativa. “Essa agenda positiva da madeira, por exemplo, sumiu do mapa. Como vai ficar? Falta transparência e segurança jurídica na transição”, diz.

Servidores protestam em frente à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (Foto: Divulgação)

A resolução confirma que a Secretaria da Agricultura deve absorver a maior parte das funções da até então Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais. Sob a Agricultura, ela ganha o nome de Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Ainda deve ser publicado um decreto de reorganização da pasta da Agricultura para detalhar a recepção das novas atribuições.

A resolução também confirma a transferência de responsabilidade para a Agricultura sobre a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e do departamento de desenvolvimento sustentável, responsável por criar parâmetros para certificação ambiental da produção rural.

O documento prevê que as informações do CAR sejam compartilhadas pela pasta ambiental, que também terá responsabilidade compartilhada pelos protocolos agroambientais, como os programas Nascentes e Etanol Mais Verde.

As atividades ligadas à biodiversidade dentro da secretaria ambiental ficam voltadas à gestão das Unidades de Conservação e áreas de amortecimento e às políticas de conservação da fauna, agora sob a nova Coordenadoria de Biodiversidade e Fiscalização.

Servidores da pasta ambiental ouvidos pelo blog entendem a mudança como um impedimento à atuação para promover a biodiversidade na maior parte do território paulista, ocupado por imóveis rurais.

Embora a conservação da fauna tenha permanecido na pasta ambiental, o grupo de trabalho sobre polinizadores foi integralmente transferido para a Agricultura, sem previsão de compartilhamento de responsabilidades ou informações entre as pastas.

A preocupação de especialistas em meio ambiente é que a pasta da Agricultura busque apenas o aumento da produtividade, desconsiderando a importância da biodiversidade.

Segundo fontes ligadas ao grupo de trabalho de fauna, representantes da Agricultura já teriam dito que poderiam focar os trabalhos apenas na conservação das espécies que contribuem diretamente para a produtividade agrícola, ignorando a conservação de espécies importantes para o ecossistema, como as abelhas nativas.

Em um vídeo enviado aos servidores e obtido pelo blog, o secretário da Agricultura, Gustavo Junqueira, anunciou a “ampliação de responsabilidades da pasta” e disse que “a partir de agora, toda a gestão ambiental das propriedades rurais privadas será de nossa responsabilidade’.

O blog apurou que a fala gerou incômodo entre os especialistas em meio ambiente por resumir as novas atribuições da pasta com o uso do termo ‘gestão ambiental das propriedades’ – que poderia desconsiderar a biodiversidade e os recursos naturais do estado.

O vídeo pede a colaboração e a integração das equipes na transição que estão sendo criadas. No entanto, servidores têm protestado, desde fevereiro, contra a falta de transparência e participação de especialistas na criação do decreto e da resolução – documentos que baseiam a mudança em curso.

Servidores da secretaria da Agricultura ouvidos pelo blog também mostraram incômodo com a falta de transparência. Eles opinam que agricultores e técnicos deveriam ter sido consultados antes da extinção de coordenadorias antigas, com mais de 50 anos de atuação, que agora são anexadas à nova Coordenadoria Desenvolvimento Rural Sustentável” – além das atribuições ambientais, ela também abrigará assistência técnica e extensão rural.

Uma das preocupações dos técnicos da Agricultura é a possível extinção das atividades voltadas à agricultura familiar, que poderiam ter suas peculiaridades desconsideradas na fusão de coordenadorias.

Na tarde desta quarta (13), representantes de associações ligadas à agricultura visitaram gabinetes de deputados estaduais na Assembleia Legislativa de São Paulo, na busca de apoio de frentes parlamentares para, segundo as lideranças, forçar o diálogo do governo com a sociedade.