Insustentável: ministro do Ambiente quis ‘causar’, mas ficou querendo

Justamente quando o governo Bolsonaro enfrenta crise aguda – com o impeachment voltando à boca do povo – o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, escolhe criar novas polêmicas para fugir das anteriores. Nas últimas semanas, ele aumentou a coleção de desgastes e deu sua colaboração para o clima de instabilidade política no país.

Só nesta semana, as decisões intempestivas de Salles pegaram de surpresa e criaram atritos com a Alemanha, a Noruega, a CGU, o BNDES, a agência de mudanças climáticas da ONU e o prefeito de Salvador – ninguém menos que ACM Neto, presidente do partido que controla a Câmara e o Senado.

Entenda a cronologia dos fatos. No início do mês, o ministro já havia cancelado uma viagem à Europa, conforme este blog revelou, após a publicação de uma carta de cientistas europeus ter cobrado compromissos ambientais do Brasil.

Há menos de duas semanas, a forte repercussão internacional da reunião dos ex-ministros do Meio Ambiente em mídias como Guardian, Reuters e Washington Post fez com que a mesma crítica voltasse até Salles. Segundo pessoas próximas do governo, ele teria sido cobrado por Tereza Cristina, ministra da Agricultura, que por sua vez teria ouvido reclamações da União Europeia.

Com respostas que minimizam e tentam desqualificar as críticas, o ministro apostou na sua eloquência e decidiu se lançar em nova polêmica. Através da coluna de Sonia Racy, do Estadão, anunciou na última quinta-feira (16) que o ministério e a CGU teriam encontrado irregularidades no Fundo Amazônia.

Três horas depois da notícia publicada, o órgão enviou nota à Folha esclarecendo que “a CGU não efetuou testes de auditoria sobre esses contratos ou avaliou os resultados que serão apresentados. As conclusões são de exclusiva responsabilidade do MMA”.

No dia seguinte (17), o ministro tentou sustentar uma coletiva de imprensa em São Paulo apenas com declarações – sem revelar dados da apuração, que só teria sido feita em
25% dos contratos do fundo.

Ainda no mesmo dia, as embaixadas da Noruega e da Alemanha, países doadores do Fundo Amazônia, manifestaram-se dizendo que estão satisfeitas com o uso dos recursos.
O BNDES, que gere os recursos do fundo, também publicou uma defesa do mecanismo, que “reflete uma experiência de cooperação internacional inovadora e amplamente reconhecida”, segundo a nota.

No sábado (18), pelo Twitter, o ministro aliviou o tom de denúncia dizendo que vai fazer um amplo debate sobre o Fundo Amazônia e que “se estiver tudo ok, ótimo”.

É de se imaginar que a mesma frase tenha sido ouvida pelo prefeito de Salvador, ACM Neto. No início da semana, ele não gostou nada de ver o ministério cancelar, de surpresa, o evento da ONU sobre mudanças climáticas previsto para acontecer em Salvador, em agosto.

Presidente nacional do DEM, partido que preside a Câmara e o Senado, ACM insistiu e informou à ONU que ainda pretendia sediar o evento. Salles teve que ceder.

“O consenso internacional quer? Vai ficar querendo”, o ministro havia dito à Folha em janeiro, em crítica aos processos da ONU. O que a experiência no governo tem mostrado, no entanto, é que o plano internacional não é tão desprendido dos interesses nacionais e, inclusive, envia recados ao ministério da Agricultura, patrocina ações de controle ambiental através do Fundo Amazônia e interessa até a governos locais, que querem sediar grandes eventos.

A aposta em isolar as críticas perde efeito à medida que as respostas passam a chegar de todos os lados. Longe de serem ongueiras ou comunistas, as instituições que responderam a Salles ao longo da semana apenas lembram ao ministro que governar exige articulação. O estilo que tem agradado ao presidente, até Bolsonaro já deve saber, é insustentável.