Câmara aprova remuneração para quem conserva, mas pode fragilizar lei florestal
Em plena crise amazônica de dimensões internacionais, as movimentações de matérias ambientais no governo federal e no Congresso continuam a todo vapor e também em direções concorrentes.
A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (3) a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, que regulamenta a remuneração a comunidades tradicionais que ajudam a conservar ecossistemas.
A lei, que segue agora para o Senado, prevê diferentes formas de remuneração – desde pagamento direto até incentivos tributários e crédito – para quem ajuda a conservar florestas e, com isso, gera serviços ambientais como chuvas, regulação do clima e redução de emissão de gases-estufa.
O projeto tem foco em povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e também proprietários rurais inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
Entretanto, no mesmo dia avançou a tramitação da MP 884, que tenta mais uma vez retirar a imposição de um prazo para que os proprietários rurais se inscrevam no CAR – o primeiro passo para regularização ambiental prevista pelo Código Florestal aprovado em 2012.
A medida provisória obteve parecer favorável do relator deputado Irajá Abreu (PSD-GO) e deve ser votada nesta quarta (4) em comissão mista.
No Código Florestal, o prazo era o critério-chave para determinar se a situação de uma propriedade rural estaria regular ou não. Sem ele, as instituições reguladoras perdem base para cobrar e punir com multa quem não iniciar o cadastramento a tempo, o que afeta diretamente o efeito do Programa de Regularização Ambiental (PRA).
Uma medida com objetivo semelhante (a MP 867) já tinha sido barrada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), no fim de junho. Ele alegou pouco tempo para a votação no fim do primeiro semestre.
Desta vez, o Planalto trabalha com a expectativa de adiantar a votação na comissão mista para que o projeto, que tramita em regime de urgência, chegue mais cedo à apreciação em plenário.
A MP inclui um ‘jabuti’ (artigo com tema alheio ao conteúdo do projeto) que propõe a flexibilização da lei de registros públicos, permitindo alterações em registros de imóveis sem ouvir confrontantes.
“Se não ouvir os confrontantes, você está reduzindo o rigor da lei, o que poderia facilitar a grilagem”, avalia Roberta del Giudice, secretária-executiva do Observatório do Código Florestal, formado por uma rede de organizações.
“Com queimadas, desmatamento crescendo e imagem do Brasil sensibilizada frente ao comércio exterior, esperamos que Rodrigo Maia cumpra com o compromisso de não colocar isso em votação”, ela afirma.
Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, sinalizou na última semana que não daria andamento a projetos que implicasse em impacto ambiental negativo para o país. O pedido havia sido feito por ex-ministros do Meio Ambiente.
No entanto, a Presidência da Câmara mantém a previsão de votar o projeto da Lei Geral de Licenciamento Ambiental no próximo mês, em outubro.
Deputados ouvidos pelo blog afirmaram que a crise na Amazônia não deve adiar a votação do licenciamento – criticado por ambientalistas por conta de impactos como o provável aumento do desmatamento.
Em tempo: ainda nesta terça, o presidente Jair Bolsonaro publicou um decreto (10.000/2019) em que altera as regras do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, permitindo que organizações civis de recursos hídricos sem fins lucrativos exerçam o papel de Agência Nacional de Águas (ANA) em localidades onde ainda não há um autoridade instalada para o assunto.
Com isso, é possível que haja desequilíbrio de poder na administração dos recursos hídricos em regiões onde um setor usuário de água esteja mais bem organizado que outros.