Ibama flexibiliza cumprimento de obrigações ambientais durante pandemia

Em comunicado publicado nesta sexta-feira (3), o Ibama altera diretrizes do cumprimento de obrigações ambientais de atividades e empreendimentos licenciados pelo órgão durante a pandemia causada pelo coronavírus. As medidas devem ser mantidas pelas empresas “na medida do possível”, segundo o documento.

O texto prioriza a manutenção de medidas ligadas a impactos diretos ao ambiente – cujo não-cumprimento deve ser comunicado por e-mail ao Ibama.

No entanto, a avaliação sobre a continuidade de medidas relativas a impactos indiretos ao ambiente ficariam, conforme sugere o texto, a critério do empreendedor.

“O cumprimento das medidas de monitoramento e minimização de impactos que não possuem natureza imediata e direta com a prevenção e minimização dos impactos ambientais deve ser avaliado e ajustado se necessário, tendo-se como norte um esforço pela não-interrupção das obrigações”, diz o comunicado.

Na interpretação de dois especialistas em licenciamento ambiental, ouvidos pelo blog sob condição de anonimato, o comunicado transfere ao empreendedor a responsabilidade de avaliação sobre a continuidade do cumprimentos da suas obrigações, o que antes era feito pelo Ibama.

No procedimento padrão, o empreendedor solicita ao órgão fiscalizador o adiamento ou a suspensão de obrigações ambientais que não possam ser cumpridas. Cabe ao Ibama, no caso do licenciamento federal, avaliar cada caso e autorizar o empreendedor a seguir ou interromper cada atividade condicionante da sua licença, conforme sua solicitação.

“A dúvida fica na delegação ao empreendedor para decidir o que o vai ser implementado. O pagamento de uma indenização pode ser afastado num quadro como o atual?”, questiona Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista em políticas públicas do Observatório do Clima.

No entanto, segundo o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, “nada mudou”.

Bim afirmou ao blog que o Ibama analisará cada caso comunicado ao órgão para dizer se um não-cumprimento é cabível ou não.

“É por conta e risco do empreendedor. É claro que ele vai fazer essa avaliação e comprovar isso [que há relação entre o não-cumprimento e a pandemia]. Se a gente não aceitar, ele vai ser autuado e provavelmente terá que fazer compensação.”

Segundo a advogada ambiental Letícia Marques, o comunicado não dá garantias de que o descumprimento de obrigações ambientais estará isento de sanções.

Ela destaca trecho do documento que diz “o órgão considerará as circunstâncias e a causa de eventuais não cumprimentos antes de inferir sobre qualquer penalidade administrativa, reforçando a ciência da excepcionalidade do momento atual”.

“Orientei meus clientes a documentar dificuldades para depois o Ibama rever”, ela afirmou.

Outro ponto questionado por especialistas é a prioridade dada a condicionantes ligadas a impactos ambientais diretos, em detrimento dos indiretos. Segundo especialistas, a depender do tipo de empreendimento licenciado, o tratamento de impactos indiretos pode ser fundamental para conter danos ambientais.

“Impõe-se verificar se as medidas que devem ser mantidas englobam os principais impactos dos diferentes tipos de empreendimentos licenciados pelo Ibama. Será que essas medidas gerais vão englobar os principais impactos a ponto de não haver danos ambientais?”, questiona a ex-presidente do Ibama.

Ainda conforme especialistas, o comunicado do Ibama guarda aspectos em comum com propostas em negociação na Câmara dos Deputados para a Lei Geral de Licenciamento, como a priorização de medidas de impactos diretos e a transferência de atribuições para o empreendedor fazer sua própria avaliação de suas obrigações ambientais.

Uma medida mais resoluta foi tomada pela agência de proteção ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês). Na última semana, a agência americana anunciou que não aplicará multas “por não conformidades com as obrigações rotineiras de monitoramento e relatórios, resultantes do COVID-19”.